O Sommelier arrebatado!

Crônicas e contos Sommelier André Ribeiro

O Sommelier arrebatado!

Certo ano, tirei férias no litoral com minha família. Tudo corria bem, muitos banhos de praia e piscina entre umas doses de vinho e espumante, muita diversão, estávamos em uma casa que nos foi cedida por um grande amigo bem na orla marítima em frente ao calçadão. Em uma noite quente, todos fomos dormir mais cedo pois o dia havia sido cheio de atividades de lazer.

De repente, alguma coisa magnética me puxou para a praia; me levantei e saí calado, pois não conseguia completar uma frase… quando dei por mim, já estava na beira da praia. A água banhava os meus pés… era alta hora da madrugada, a praia estava deserta quando para meu espanto escutei um canto e vi surgir do fundo do mar uma entidade em forma de mulher muito linda e luminosa. Reconheci pela estátua que tinha visto na noite passada e me chamara a atenção: era Iemanjá, a rainha do mar.

Calado e paralisado, escutei sua voz e, como um suave canto, ela me perguntou

– Seu nome é André?. Eu respondi sim, senhora.
– Você é Sommelier?

Fiz que sim com a cabeça, pois as palavras não saiam de minha boca. Então ela disse preciso dos seus serviços vou promover um jantar com todos os maiores protetores e cuidadores dos sete mares e gostaria de servir um vinho para harmonizar…

Meu espanto foi tremendo! Era um misto de orgulho e felicidade por ter sido eu o seu escolhido, logo eu, que me considerava uma gota de vinho em um grande tanque de inox de mil litros, não pude acreditar que a rainha dos mares foi buscar o meu auxílio para tão honorável tarefa.

Respondi: seria bom, minha grande rainha, fazermos a prova dos elementos culinários com os vinhos, mas como você pode ver não temos os pratos nem o vinho…
Ela bateu palmas e eu vi emergir do mar várias sereias carregando o banquete, coisa que eu nunca pude imaginar, e pela delicadeza dos pratos disse acho que um Sauvignon Blanc iria bem acompanhar. Novamente ela bateu palmas e o vinho apareceu, provamos juntos e a harmonia aconteceu. Então ela desabafou e disse: o céu é azul, a água é clara, a espuma das ondas é branca… será que não teria um vinho tinto?A cor muito me encanta e gostaria de utilizar para acompanhar o meu jantar…
Refleti um instante e disse talvez um bom Pinot Noir, minha Rainha, ao seu jantar irá agradar. Ela, mais uma vez, bateu palmas e o vinho apareceu. Era um vinho chileno chamado cavas submarinas, então provamos juntos e tudo se harmonizou perfeitamente e, para celebrar, as sereias começaram a cantar … “é Pinot Noir, é Pinot Noir, o vinho que foi escolhido pro jantar de Iemanjá… é Pinot Noir, é Pinot Noir o vinho que foi escolhido pro jantar de Iemanjá…Iemanjá fez uma festa para a vida celebrar e o vinho escolhido foi o tal Pinot Noir …”

Nunca vi cena tão bela, tudo a luz do luar, aqueles seres divinos foram na água sumindo e se afastando devagar e, como em um transe, despertei e saí atordoado, retornei à casa num misto de realidade e devaneio sem saber o que de fato aconteceu. Abri a geladeira atordoado procurando algo pra beber e, para o meu espanto, o que encontrei? Uma garrafa de Pinot Noir toda envolvida em algas marinhas. Peguei o saca-rolhas, uma taça e fui pra varanda. Nunca tomei vinho de aroma e sabor igual. Ao cair na taça, tinha som de ondas quebrando na areia e retrogosto e sabor infinitos como o mar aos olhos humanos.

Minha esposa despertou, foi ao meu encontro, me olhou e disse: amor, sozinho aí a essa hora? E esse vinho, onde você encontrou? Tomamos a última garrafa de vinho ontem, lembra? Olhei pra ela, sorri e disse deixa pra lá… se eu contar, você não vai acreditar…

Ela tomou a taça da minha mão, deu um gole e disse sorrindo Nossa! Que vinho bom!
Eu respondi: realmente DIVINO!

André Ribeiro
#pordentrodovinho